Jac era um cara bastante razoável... Muito caprichoso, muito nervoso e muscular, mas muito razoável também. Tudo bem, aquela história de ser marido “de fato e direito” (como ele gostava de falar) ainda era difícil de engolir. Mas havia algumas contrapartidas sim. A questão de trabalhar era uma, ele foi muito bonzinho em pedir à Livi que se tornasse sua secretária particular porque ela começava a receber mais e a trabalhar muito menos. Na verdade a grana era o que não importava já que ela não precisava mais se preocupar em pagar conta nenhuma, era o tempo a mais que interessava porque o que gostava mesmo era de ler e escrever a respeito e publicar numa revista de literatura de distribuição gratuita que obviamente não pagava por artigo nenhum. O Jac não deixou que ela abandonasse o serviço só pra o pai dele não achar que ele tinha escolhido pra esposa uma pistoleira (ele era muito preocupado com a imagem que o pai tinha dele, muito mesmo!). E ela, elazinha aceitou, como não? Trabalhava pela manhã, almoçava com o Jac, voltava pra casa e lia a tarde toda e uma parte da noite também, porque o Jac era workahollic e só aparecia em casa depois das nove. Estava se sentindo a própria Luísa d’O primo Basílio, se bobeasse arranjava um caso e morria de culpa também... Ah, mas que coisa engraçada! Olívia com uma vida de mocinha burguesa, mas nem em mil anos isso lhe passaria pela idéia, esse tipo de vida.
Mas essa coisa de o Jac ser razoável também tinha lá o seu preço porque se ele fazia tudo quanto era possível pra atender o que ela pedia, ela também tinha que agüentar o dia-a-dia com ele, que era uma coisa bem besta! Mas bem besta mesmo! Nossa! Vivia permanentemente entediada por ficar sozinha na maior parte do tempo; tinha sempre uns jantares perfeitamente bem cuidados por um profissional que o Jac pagava pra isso; tinha que ir ao shopping uma vez por semana pra o Jac comprar sua produção e um presente pra ela também, que ela tinha que escolher (e ela detestava ir a shoppings); muitos eventos sociais povoados de gente chata que só falava de trabalho e pra quem o Jac adorava exibi-la. Ah sim, essa era outra coisa chatinha, o Jac saía desfilando com ela de um jeito bem exibido e orgulhoso e antipático, afinal, ao contrário dos caros-colegas, ele tinha uma mulher-que-não-era-vulgar-como-as-outras (isso virou uma fórmula fixa), era uma escritora elegante e discretamente bonita, mas muito gostosa... Olha só, uma intelectual gostosa, mas que coisa mais bacana, hein! Agora já tinha se tornado a Bonequinha de Luxo... Que nojeira! Mas estava bem, ela se vingava sendo desagradável de propósito, dando a entender que ninguém tinha nível cultural bom o bastante pra conversar longamente com ela além do João Carlos. Essa era a pegada, chamar aquela mulherada turbinada de burra na cara-dura e ver que elas nem percebiam... Isso era o que chegava a ser cômico e perdia a graça logo depois. O Jac nessas horas dava umas risadinhas maliciosas e fazia um trejeitinho estereotipadamente bicha de propósito: ela era blasé e o ia contaminando. E era foda, como ninguém daquela gente entendia direito por que eles tinham se casado, se tornaram um casal incrível. Tinha inclusive sempre alguém que vinha dizer que eles eram ótimos juntos, sempre alguém que ela achava bem legal e de bom gosto e isso acontecia tantas vezes desde que ficaram noivos que ela, Olívia, ela mesma, já estava se acostumando a ser lida dessa forma e ao personagem, que no final das contas também não lhe caía mal. Daí tinha a coisa do Jac ser aquele cara razoável, intuir que ela não vinha estando satisfeita com a vida e tentar agradá-la de todo o jeito possível, com gentileza quase cavalheiresca, o que era uma coisa fofa e ela ficava gostando bastante dele por isso. Tinha também outra coisa, muito futilzinha mas importante: o João Carlos era bonitinho pra-caralho com aquele corpo de jogador de vôlei e carinha de garoto-propaganda de pasta de dente ou de shampoo. Isso tornava muita coisa mais fácil – a coisa dos desfiles sociais e do sexo passavam mesmo por ali, quer dizer, eram filtrados pela beleza dele e pareciam mais finas assim.
Achava que por alguma alquimia estranha nascida nesse cotidiano ainda acabaria amando o Jac e o repouso sobre essa idéia a preparava para todas as canseiras.
quinta-feira, 18 de outubro de 2007
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