sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Tem dia que de-noite é f...

Tem noite na vida da gente que não faz muito sentido. Entende que eu quero dizer? É assim: no fim da vida, suponha que a gente fizesse um balanço de tudo quanto aconteceu; vai lembrar de coisas muito boas, muito ruins, vai chorar um pouco e rir outro pouco, mas certamente não vai pensar em alguns dias, esses em que nada acontece de anormal, esses em que tudo está aparentemente imóvel, em que a gente diz que a vida é mais-ou-menos e que, se existissem num sem-fim, seria o próprio tédio a existência. Não que não haja sentido nesses dias, não é isso que eu tou dizendo (porque há sim: eles servem pra acalmar os ânimos, pra nos descansar um pouquinho). Mas é que a gente podia ficar sem eles, ah!, e como podia!


Essa noite de que eu lembrei agora é assim, sem a menor razão de ser. Eu tava sentado na poltrona do meu quarto, lamentando que meus pés estivessem gelados... Insone, como o de costume e note-se: insone é não notívago, porque ser notívago é dar sentido à noite. Ser insone não, ser insone é algo cuja definição é negativa, o mero não-sono, a incapacidade de sonhar mesmo. Bem insone, sentadinho, velando a naninha do meu namorado e lembrando dela. Nunca pude entender por que movimento da alma ela sumiu da minha vida. Pensando bem, nem porque ela apareceu também. Era bonita (e não linda), distante (e não inalcançável), gentil (e não fina), bastante doce (mas nunca entregue). Tínhamos uma amizade um pouco calada, bem pouco verbal. Em geral o que ficava por falar era o que mais a gente sabia um do outro, tudo intuitivo. A gente trocava livros e discos e filmes, era mais por aí que a gente se entendia mesmo. A gente dançava junto e falava de política de vez em quando.


Um dia cismei com pousar mãos no corpo dela e ela deixou – ela era passiva, deixava sempre. Talvez porque sabia que eu não tinha por hábito transar com mulheres, talvez porque estivesse afim mesmo (vai saber!)... O fato é que muitos meses se passaram até que a gente transasse. E foi bom. Porra!, foi bom sim! Eu devo ter passado quase duas horas só acariciando até acontecer qualquer coisa que não fosse assim... superficial. Se ela gostou? Como saber, não é mesmo!? Eu sei que fiquei tenso quando tornamos a nos ver depois dessa vez. Sempre que encontrava meu namorado, sentia que estava na minha testa as palavras COMI MESMO, E AÍ?! gritando pra ele, que sempre me achou muito mal-resolvido com mulheres. Deu vontade mesmo de contar, mas não contei. Achei que era o caso de guardar aquilo só pra mim. Ninguém mais sabia, só a gente, e se ela por acaso morresse, só eu saberia e ficaria confuso: teria mesmo acontecido? Seria questão de tempo pra experiência virar sonho e deixar de existir enquanto fato.
Mas ela não morreu. Foi pra Nova Zelândia. Assim: foi-se, acabou, já era. Nem deu tempo de nada – se é que eu faria alguma coisa caso soubesse com antecedência. Fiquei sabendo mesmo no aeroporto, duas horas e meia antes do instante em que eu nunca mais a veria. Mas como-assim ela estava partindo? “Tudo bem, é só por hoje, amanhã já acaba tudo...” E ela me beijou. E eu não a vi mais. E eu mandei e-mails. E ela não retornou. Bem assim: foi-se, acabou, já era.


E eu pensei: “sorte que não era um grande amor. Já pensou, rapaz? Já pensou na merda que seria? Puta-que-pariu!, as pessoas são estranhas...” Corrijo: são muito mais superficiais do que se pode julgar. Mas também, fazer o que? Hoje em dia tudo acontece tão rápido... É muita informação, não dá!


Mas tudo bem... Tudo bem, tudo-bem, né? O fato foi que na tal da noite sem sentido eu não havia trocado uns carinhos com o meu namorado. Não ventava. Nenhum ruído de carro. Nenhuma chuva. Nenhum nada. Só a barulheira desesperada do meu pensamento gritante, procurando pela voz dela em qualquer lugar da minha memória: o cheiro, o gosto da boca e do sexo, a cara. A cara... – eu nunca tinha tirado foto nenhuma, mas que azar! Logo a cara eu estava esquecendo... – A noite inteira, inteirinha. E no raiar do dia, prometi pra mim que passaria a tomar um negocinho pra insoniar menos.

5 comentários:

  1. é, tem dia q de noite é phoda, com ph mesmo... pq pensamos tanto nas noites em que não há nada pra fazer???? beijos

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  2. Pois é... Pois é...Tem noite que são assim, um vazio completo...

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  3. lindo, como tudo o mais que você escreve. bjs

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  4. Hummm... pior é quando você sabe que tá perto e não tem mais jeito mesmo!

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  5. Lorena, querida, muito obrigada!

    Andre, vc sabe que tem razao... Eu acho bem isso mesmo, que estar perto sem ter como voltar e bem pior...

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