As armas do pensamento crítico do paradigma da modernidade, que eram poderosas e mesmo revolucionárias, transformaram-se com o tempo em pistolas de sabão que, como a de Woody Alen, se derretem na chuva quando com elas pretendemos forçar a nossa fuga da prisão.
Bonito isso, não? É claro que não, nem um pouquinho que seja. Em verdade, é terrível, mas é como as coisas são. É isso que é a pós-utopia, que muita gente chama de pós-modernidade. Não falo muito disso porque tem muita gente que o faz de forma mais eficiente e eloqüente que eu. Mas não, isso nada tem de bonito. É que nem o Kafka. O que tem de bonito ali? Nada! Eu acho o Kafka a expressão máxima da falta de beleza. Mas não da feiúra, porque não acho que falta de beleza implique em feiúra com necessidade. Pra ser franco, também não me dou com nada muito exuberantemente bonito. De fato, a beleza me incomoda, me irrita e me sinto seguro em me afastar dela e, mais que isso, em a agredir.
É como ela: nunca houve e nem haveria nada tão belo. E o que mais eu podia fazer se não me apaixonar? Pois sim, me apaixonei. E passei a buscar distância dela por isso. Tão irritantemente bela, com seus discursos transformadores, sua utopia bem articulada, seus olhos imensos e claros que nunca se fecham, nem pra piscar, sua voz, clara e audível, suas palavras de alcance universal. Tudo tão urgente, tão real! A apresentação de uma outra realidade, tão possível! Tanta beleza inebria! Sim, inebria, chega até a intimidar.
Meu cu pra tudo isso! Fico extenuado e extremamente insone! Porque não tenho uma gota sequer de toda essa beleza démodé. Eu sou o que nunca dorme, não tenho sonho e nem pesadelos, nada se passa pela minha cabeça sem que esteja acontecendo ou já tenha acontecido. Fico extenuado e extremamente insone.
E é por isso que ela me cruza, me arrebenta, me destrói... E eu gosto, eu peço bis. Fico exultante toda vez que me lembro que me tornei gay por causa dela. Pois é claro, eu me apaixonei pela beleza e ela por mim, devido a tal beleza. Ela queria me salvar, queria me fazer sonhar, e toda vez que eu sentia isso, meu desejo máximo era o de esfregar merda na cara dela. Quando ela disse que me amava, foi um prazer desgostoso dizer que era gay e talvez até misógino. E eu nem era, mas fiquei sendo a partir desse dia. Me acontecia de fato apenas de não gostar de sexo. Mas se eu dissesse isso a ela, era mais uma razão pra ela se esforçar em me salvar e mais uma beleza. E somos amigos, e ela me crucifica o tempo todo... E eu faço tudo que posso pra ela ter motivos para tanto. Sou masoquista mesmo, sou sim. Vê-la nervosa me machuca; ela me machuca por estar nervosa. Estratégia perfeita, não é? Com um único ato meu, tenho duas ou três contrapartidas de dor. Bela zona, não é?
Mas e aquela história, também bastante démodé, de que há uma ordem no caos? Nada, na pós-utopia a ordem é o próprio caos. A organização é tamanha, tudo tão bem compartimentadinho e especializadinho, tanta coisa junta que se for ver mais de longe, não se vê mesmo nada! Só uma puta duma zona bem homogênea. É isso que a beleza dela precisa socorrer, mas nada! Na zona, já se institucionalizou a putaria e a puta-mór vem travestida pela super-correção social e todo mundo bate palma quando a vê chegar.
Mas ela, ah!, ela vai atrás de um jeito de matar essa puta-mór. Ela sai de pistola de sabão em punho todo dia de manhã, ela dorme com a pistola debaixo do travesseiro. Eu poderia até querer que um dia ela conseguisse tudo o quanto almeja, mas não quero. Também não quero que tudo esteja como tal... Mas minha idéia sobre ação individual me faz não ter querer nenhum a respeito de nada. O que eu quero, o que eu quero mesmo, maso-edonisticamente é que ela me arranhe, me jogue na parede, me crucifique e me corte em mil partes, pra renascer no dia seguinte e a obrigar a repetir toda essa operação.
quarta-feira, 10 de setembro de 2008
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Quem é Natan?
ResponderExcluirBob: ah, é uma persona literária minha, tipo um alterego.
ResponderExcluirUm outro amigo perguntou a mesma coisa ainda hj. Querendo ler mais sobre isso, tem esses linques aí abaixo. Não é de ontem que escrevo sobre ele, rs.
http://pos-utopia.blogspot.com/2008/04/dirios-noturnos-de-natan.html
http://pos-utopia.blogspot.com/2008/04/dirios-noturnos-de-natan_08.html
http://pos-utopia.blogspot.com/2008/04/dirios-noturnos-de-natan_10.html
http://pos-utopia.blogspot.com/2008/04/dirios-noturnos-de-natan_21.html
http://pos-utopia.blogspot.com/2008/07/dirios-noturnos-de-nathan.html
a hermenêutica é a beleza ;P
ResponderExcluirApareça ou surja. Não vá se perder por aí.
p.s: parece até mensagem codificada, é só uma mensagem chapada.
Ericka: gostou, nêga??? Tua opinião sobre esses meus textos é importante!
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