quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Querido diário...


You took the best... so why not take the rest?


Querido diário,


Nesse exato momento, um cacho louro do meu cabelo se desprendeu do arranjo que fiz e me caiu sobre o nariz. Não gostei da sensação e tornei a prendê-lo, mas sei que ele também não gosta de estar preso e se rebelará em breve. Estou à luz de meia foda, ao som de Misty, sentindo cheiro do incenso que acendi pra diluir o cheiro do cigarro de cravo.


Antes de entrar no quarto e escrever, eu tomava um creme de alho poro, a coisa mais láite que me permiti comer, por ter constatado que estou três quilos acima do peso que gosto de ter. Tomei-a na presença de minha pequena e doce irmã, que me bombardeou com a hipocrisia de algumas opiniões que eu sei que ela não tem. Preparei a sopa devagar. Antes disso, minha irmã preparava seu miôjo e levava para o quarto, para ver na tevê a Maysa deixando falar o coração.


Cheguei em casa depois de ter passado no mercado, à procura de berinjelas; não tendo logrado êxito, fui a outro mercado – eu estava bem determinada a conseguir três grandes e violáceas berinjelas para o posterior preparo de uma fornada láite. O primeiro mercado foi o Pão-de-açúcar da Consolação; eu estava na região por ocasião de me haver encontrado com meu amigo mais antigo, hoje também meu advogado. Tratamos de relatos sobre as festas, romances, projetos de viagens, trabalhos e sobre o meu processo.


Para chegar ao encontro, o busão que tomei não tardou e nem se emperrou no trânsito – o que é mais comum nessas épocas do ano. Isso me rendeu um tempo de espera diante de lojas da Paulista.


Meu dia de trabalho foi tranqüilo, sem incidências desagradáveis – o que é incomum em quaisquer épocas do ano. Almocei uma feijoada - apenas o arroz, o feijão e a couve, precedidos por uma grande salada. Não dispensei a pinga que a acompanhava... Super, super láite. Acompanhavam-me uma amiga do trabalho e seu namorado, amigo por tabela.
Ainda em casa pela manhã, escolhi minha roupa espantosamente rápido. Tomei meu café – caputino e torradas - na companhia de minha irmãzinha, que elogiava com veemência a invasão do Carandiru ordenada pelo Governador Flaury, tendo, em seguida, feito comentários negativos sobre a protuberante barriga do nosso atual presidente. Concomitante a isso, um relâmpago de erro me passou pela mente: “fascista que já nasce feito... como pode ter o meu sangue?”.


Acordei ao suave som de uma música riponga de 1968, agarrei os lençóis, lembrei-me cuidadosamente do pesadelo da noite passada, quase me aliviei por estar acordada, mas pensei em seguida que não, que depois de 27 anos, já estou quase me acostumando a eles, embora eu tenha uma política pessoal de jamais me acostumar com merdas.


Meu querido diário, o dia acaba agora, com mais um cigarro de cravo e o fraseado do trombone de All of me. O cacho louro me faz coçar a ponta do nariz.

15 comentários:

  1. Para Svenden, contra o tédio, ainda não inventamos nada melhor do que o remédio do Romantismo: uma mistura de anestesia (drogas lícitas e ilícitas) com transgressões que deveriam provar que estamos vivendo grandes aventuras e experiências “incríveis”. (…) O tédio moderno é uma forma de arrogância: a vida é chata porque nós seríamos maiores que sua suposta trivialidade insossa; tendemos a menosprezar o cenário onde nos toca viver, como se ele fosse demasiado banal para nossas façanhas. (Contardo Calligaris)

    Ainda bem que vc não tende ao tédio de menosprezar a façanha de um pequeno cacho ;)

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  2. eu sempre piro no que você escreve...

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  3. faltou dizer que o texto tá maravilhoso, maravilhoso, maravilhoso. e que se eu fosse jurada de concurso de contos dava o primeiro lugar pra ele, hehehehehe. bjs!!

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  4. Ericka: minha opinião sobre o tédio é bem esse que vc transcreveu... Mas vou te falar que me intediam as grandes e generosas questões abstratas. O que eu vivo é o cacho de cabelo e não aessência de ser loura e blablablá... Comentário muito bom, hein!

    Cris: ah, obrigada, nem sei oque dizer... Mas vou te falarque esse continho é realmente o meu dia de ontem. <3

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  5. Demais, minha cara Lia! Quase ouço a música de fundo.

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  6. Ah, abrigada, lindo!!! Sua opinião é importante pq vc, eu tou ligada, é exigente, hehehe!

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  7. Fico imaginando como seriam as próximas entradas neste diário.

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  8. Bob: heheehe... é, legal... eu vou fazer, sei lá, uma vez por semana, vou ver se consigo, hehehehe!

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  9. Hum, aguardo as cenas do próximo dia!
    Muito bem escrito, Lia. Gostoso de ler. Adoro escritos diarísticos! (rs)
    :)
    Beijo

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  10. genial, genial, genial.
    mais uma delícia de texto!

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  11. Moni e Lu: ah, muito obrigada, linda! Puxa, muito feliz com o comentário de vcs tb, q tb são de muito bom gosto.

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  12. Ai, Lia, que texto é esse? Um dos melhores, puxa vida... lindo, adorei. Beijos, querida. Tava com saudades de passar por aqui...
    Ah, e voto de um feliz 2009 atrasado ainda vale? :)

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  13. Su, muito abrigada tb! E vcle sim, vale tudo!!!
    Bom 2009 pra vc tb!!!

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  14. perfeito, igual filme qndo a gente rebobina fita [vhs], q vê tudo acontecer ao contrário...
    beijos

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  15. AI, QUE BOM QUE GOSTOU... fOI ASSIM MESMO, UM DIA DO FIM PRO COMEÇO, HEHEHE!
    MIL BJINHOS!!!

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