segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Bom dia!


Esticava bem o corpo pra afastar os vestígios de sono. Bem esticado o corpo... Ah!, gostoso. O barulho da água despencando das nuvens dava vontade de voltar a dormir... Mas nada! Hora de levantar que a mulher já estava de pé – seu vulto bloqueava a luz do dia na janela à esquerda e à direita e agora à esquerda outra vez. Tanta chuva, nossa! Era melhor ligar o som pra não cair na melancolia... Tocava ‘Round Midnight, muito pouco propício pra começar o dia, mas era tão bonito! Se ele estivesse ali naquele instante, daria um sorriso, diria que gosta do Miles e agarraria pela cintura, mas que delícia! Sentiu enfebrecer entre as pernas ao ato, e a febre foi subindo por dentro e tomando os membros... Agora o rosto... E ela entrava agora, bem agora: “Bom dia! Mas que carinha mais vermelha é essa?” Nada, era nada não, nada que pudesse explicar agora. Um sorriso amarelo... Difícil lidar com esse tipo de situação. Se ele estivesse ali agora, diria que a vida tem um humor que tende entre Woody Allen e Pedro Almodóvar, ele sempre tinha um ótimo comentário pras situações irônicas... Pensando nisso, uma nova onda de febre vinha vindo, vindo do sexo e inundando todo o corpo: caramba!, tinha que dar um jeito de parar de pensar nele. Mas o fato era que nem queria, nem queria muito.

Ajudava a mulher no café, conversavam sobre um filme visto na noite passada, sobre o tempo, sobre o trânsito... E se lembrou de que ele se recusava a comprar carro por convicção, preferia organizar a vida de modo que pudesse andar a pé todo o tempo. Sentiu o corpo se excitando outra vez, coisa que costumava acontecer com dificuldade e agora, nas primeiras horas da manhã, já havia acontecido mais de uma vez. Era melhor sair, dar uma volta sem companhia. Ela estranharia, mas tudo bem.

E ela estranhou mesmo: “Não quer ficar comigo? Prefere andar na chuva?” – não, não queria ficar com ela, não por falta de carinho, mas porque precisava de solitude, tendo em vista as várias respostas involuntárias do corpo à lembrança dele, era melhor que não desse tanta pala... Sabia lá. Mas ia, ia de carro até a biblioteca. Vestiu-se, pegou as chaves, um beijinho pra ela não se sentir largada e até-logo.

Era melhor assim, podia deixar com mais calma a imagem dele vir e ir. Não parou na biblioteca, apenas dirigia pela cidade ao fim das contas, sem se incomodar com o triste tráfego... Sem rumo, só admirando os prédios e as praças de que ele falava tanto: era um paulistano apaixonado e tinha olhos de quem vê o mundo pela primeira vez... Sentiu o sexo pulsar outra vez e se sentiu contente por isso. Talvez fosse paixão... Que bom ainda poder se apaixonar, mesmo depois de todo aquele tempo... Sentiu-se então meio brega... Mas feliz sim, bem feliz, especialmente porque o dia estava apenas começando.

Um comentário:

  1. Falar o que?
    Woody e Almodovar brigam pela pena do destino.
    Mas numa boa, que, afinal, escrito a quatro mãos fica até mais divertido...
    Ps: Febre. 40 graus. Sempre.
    Chama a enfermeira... a de sainha curta, lóóóógico!!

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