
O ombro direito já estava doendo sob o peso do corpo, o que o obrigou a mudar de posição. Já era a quarta vez que procurava alguma posição que não incomodasse o corpo. O pior da insônia era isso: dolorir o corpo todo. Merda! Isso invariavelmente lembrava que se ele estivesse ali naquele momento, certamente se ofereceria pra bolar um baseado e fazer uma daquelas massagens indianas com que trabalhava. Mas ele não estava, não estava porque era ex. E também não tinha maconha, não tinha porque isso fazia parte da vida que foi deixada pra trás, tornando-se assim uma ex-vida. Então, das coisas que faltavam no momento, já tinha pensado em três: massagem, maconha e namorado. No espaço sideral particular, ele via essas coisas juntas, depois dissociadas, depois associadas a outras coisas, depois uma-a-uma novamente. E tinha medo... Talvez não fosse medo, talvez fosse só a resistência do espírito, uma inércia da alma, desejo íntimo que a gente sempre tem em se conservar no estado em que se está. Mas talvez fosse medo sim... Mas medo do que, né? Medo pressupunha dúvida sempre, porque se existe certeza, então não é medo, é desespero. E não estava desesperado, apenas sentindo alguma coisa estranha, quase que indefinível.
Era, na verdade, o caso de ligar pro ex, mas acontece que ele nunca liga pra ex nenhum, não se sente no direito de ir invadindo desse jeito a vida de alguém em processo de reconstrução – que responsável, né?! Responsável sim, mas mais de bode mesmo, porque a ligação vai implicar em lamentos e lamentos em concessões e concessões são reencontros e reencontros vão fazer o ex implorar por sexo com os olhos e aí, meu-deus, aí ia foder com tudo mesmo! Tudo meeeesmo! Mas, puta-que-pariu!, que saudade! Que vertigem... Se ao menos conseguisse pegar no sono, se ao menos o corpo não lhe doesse... Se ao menos esse maldito cansaço lhe servisse pra dormir! Como a cabeça da gente faz as coisas de forma artificiosa, hein! Veja bem: ele esteve bem durante todo o processo de separação, enquanto o outro se desfazia em jorros emocionais dignos de Gardel. Mas e agora? Agora o outro se afoga na orgia à luz do dia, enquanto na calada da noite ele fica de olhos estatelados pro teto, vislumbrando no vazio um infinito com a idade do céu. Dali a apouco amanheceria, ele teria de trabalhar e seria mais uma noite, mais uma noite perdida entre pensamentos que gritam muito, muito alto dentro da cabeça. Mais uma noite gasta, uma noite em que careceu de amor muito fortemente, mas que a luz da razão, por fraca que fosse, deu o norte pra atitude.
Nesse segundo, o que lhe pareceu mais sensato foi... Ah!, desistir, desistir enfim da caminha e fazer um bom alongamento antes que os músculos se rebelassem e lhe proporcionassem um dia-seguinte cheio de torsicolos e maus-jeitos infernais.
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