
Quando eu lia um romance, tinha a inclinação de me encantar por um personagem. De fato, num romance é sempre o personagem que salta aos olhos. Então você lê e já o imagina vivendo, falando, comendo, se desesperando, trepando... Alguns personagens passam até a fazer parte da sua vida, como se fossem exemplos do que se deve (ou não deve) fazer e você pode mesmo se envolver emocionalmente com eles. Assim: quem não morreu de compaixão pelo Gregor Samsa d’A Metamorfose? E quem não morreu de raiva do Brás Cubas? E quem não amaria a Tereza d’A insustentável leveza do ser? Personagens são criadas pra isso mesmo, pra você se envolver com elas e se deixar enganar, deixar passar um elemento muito mais sutil e ardiloso...
Esse elemento é o narrador. Num bom romance, num romance (ou seja lá qual outra forma de narrativa) muito bem composto, o narrador é realmente um filho-da-puta. Ele é em geral muito discreto, mescla descrições e narrações e principalmente, apresenta todo um quadro histórico-político-social sem usar sequer um único termo próprio a esses estudos, sem dar uma data, sem falar o nome de nenhum presidente. Mas ele não entrega nada disso de bandeija pro leitor. A esse ele entrega apenas a magia de uma vida ficcional: o personagem. Um leitor desatento ou meramente descomprometido em geral vai acabar a leitura exatamente onde o narrador esperava.
Não vou me gastar com milhares de exemplos, cito apenas o mais obvio: o Machadão. Ele escrevia folhetins e crônicas que simplesmente acabavam com a moral da sociedade brasileira, pelo simples fato de lhe passar um raio x. Era uma boca infernal mesmo! E era o que se poderia considerar bésti-seler assim mesmo. Por que? Por que a classe privilegiada gostava de se ver desmoralizada? Claro que não! Era porque todo mundo se deixava levar por aquele narrador do caralho! Todo mundo se questionava se a Capitu traiu ou não o Bento, mas ninguém percebia o quanto ela era moderna e o quanto ele era patriarcal e machista. Pois era bem essa a intenção: é isso o que faz um bom narrador.
É como se esquizofrenicamente houvesse uma vozinha bem dentro da sua cabeça, mas você não atentasse a ela por estar um tanto seguro do que você é (ou criou para ser). O narrador é a verdadeira consciência de uma narrativa.
Esse elemento é o narrador. Num bom romance, num romance (ou seja lá qual outra forma de narrativa) muito bem composto, o narrador é realmente um filho-da-puta. Ele é em geral muito discreto, mescla descrições e narrações e principalmente, apresenta todo um quadro histórico-político-social sem usar sequer um único termo próprio a esses estudos, sem dar uma data, sem falar o nome de nenhum presidente. Mas ele não entrega nada disso de bandeija pro leitor. A esse ele entrega apenas a magia de uma vida ficcional: o personagem. Um leitor desatento ou meramente descomprometido em geral vai acabar a leitura exatamente onde o narrador esperava.
Não vou me gastar com milhares de exemplos, cito apenas o mais obvio: o Machadão. Ele escrevia folhetins e crônicas que simplesmente acabavam com a moral da sociedade brasileira, pelo simples fato de lhe passar um raio x. Era uma boca infernal mesmo! E era o que se poderia considerar bésti-seler assim mesmo. Por que? Por que a classe privilegiada gostava de se ver desmoralizada? Claro que não! Era porque todo mundo se deixava levar por aquele narrador do caralho! Todo mundo se questionava se a Capitu traiu ou não o Bento, mas ninguém percebia o quanto ela era moderna e o quanto ele era patriarcal e machista. Pois era bem essa a intenção: é isso o que faz um bom narrador.
É como se esquizofrenicamente houvesse uma vozinha bem dentro da sua cabeça, mas você não atentasse a ela por estar um tanto seguro do que você é (ou criou para ser). O narrador é a verdadeira consciência de uma narrativa.
Putcha-la-merda. Que texto bom.
ResponderExcluirLeio, escrevo, mas tinha uma coisa com o Machado. Não gostava, não lia. Agora vou ter que ler de novo. Passaram-se tantos anos... e nesse tempo todo só esse teu post me convenceu a ler Machado.
Sou visitante novo aqui, mas tenho voltado com curiosidade. Nunca me arrependi.
L.
L.: nossa, muito obrigada! Bom que gostou, achei que era meio chatinho, meio acadêmico demais...
ResponderExcluirValeu mesmíssimo!!!
chato nada. Melhor texto do dia.
ResponderExcluir:)
Machadão, sempre ele, né?! Não tem jeito e acho que não tem exemplo melhor.
ResponderExcluir:)
Muito bom seu post. Gosti! (gosto de todos, sabe?! Mas fico sem graça de comentar!)
Beijos e obrigada pela caneta! (juro que devolvo no próximo grupal!)
L. Mais uma vez, obrigada! Qual a sua formação, que mal lhe pergunte?
ResponderExcluirMoni: tua opinião é muito legal de ter. Tou feliz por ter ve como leitora. Se tiver pregui de comentar, tem erro não, vc ler já me deixa muito feliz. E nem esquenta com a caneta, no grupal vc devolve, hahahaha!
A minha vó sempre dizia que eu não devia confiar em narradores nem em pessoas que não lavam a mão depois de usarem o banheiro.
ResponderExcluirEm todo o caso, o barato dos livros é ficar vendo qual é a do narrador. Bom, pelo pra mim q tenho mania de interpretar tudo. Mas acho q é vício da facul...
oi lia lee,
ResponderExcluirciências sociais, terminando a tal dona tese. Até fiz um(s) posts falando disso lá no meu blog.
;)
L.
Cris: Adorei a filô da sua vó!!! Mas eu desconfio que a mania é que te fez entrar em letras.
ResponderExcluirL.: acabei de sair de lá. Eu e a Beth, que é amiga da Lorena!
Pois muito obrigado pela visita e pelo elogio. Vindo da dona desse texto, é aceito com gosto.
ResponderExcluirE também já aproveitei pra visitar o blog da Beth.
Oi Lia, vim retribuir a visita e... óh! Que baita texto. Adorei. Acadêmico nada, leitura leve e solta. Parabéns mesmo. Virei freguesa! ;) Beijos.
ResponderExcluirL. e Su: tb virei freguesa das reflexões de vcs! Bloguesinho muito agradável mesmo e vcs pareceram um casal incrível!
ResponderExcluirBjos!!!
Muitas vezes sou bem lerdinho para notar essas sutilezas. Talvez seja por ser objetivo demais, fato que reflete no caminho que resolvi seguir na vida acadêmica. Preciso para um momento e reler muito que já li e ver se capto essas nuances que muitos citam, mas sem antes ter o caminho explicado para mim.
ResponderExcluirEita Lia, nunca tinha visto assim, gostei do ponto de vista... beijos
ResponderExcluirBob e Sentimental: acho que a intenção de quem escreve é essa mesma: dar várias camadas de significados pra um texto. Você pode ler a título de deleite ou como documento histórico, dependendo do olhar que se lança. Eu acho que pego essas coisas por ser letreira mesmo. Mas vai tempo até afinar o olho, eu mesma demorei uma cara!!!
ResponderExcluirnunca fiz muitas leituras do machado por falta de oportunidade mesmo, sempre gostei mais dos portugueses - do eça, principalmente! mas claro que você tocou num ponto essencial: o velho bruxo do cosme velho era ducaralho, simples assim. você explicou muito bem e de maneira leve esse lado dele. bjs, minha linda!
ResponderExcluirPQP! É o melhor escritor do Brasil! Machado! kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
ResponderExcluirEu acho ele simplesmente fodástico mesmo. E narrador bom é narrador morto. Maldito Brás! hahahahahahahaha...
E a exposição do Machadão??
ResponderExcluirSe bem que eu queria ir com o Pasta de guia cultural, pra ouvir os comentários de Sua Santidade...
Lorena: tb adoro portugueses. Mas o narrador machadiano é de matar qualquer nêgo, né? Obrigada, linda! Bjos!!!
ResponderExcluirAndré: prossigo concordando contigo!!! Saudade de vc no e-grupal!!! Bjos!!!
Homem do saco: A succionada foi foda, hein, mininu!!! Hahahahaha! Mas vamos nessa porra sim, porque não, né?