Natureza
Não pôde atender o telefone porque estava ocupadíssima, toda atrapalhada com a filosofia da imanência, cuspindo deus sive natura até pelas orelhas. Coitada, deve estar até sem dormir. Ele mesmo tinha tido uma idéia inadequada, mutiladíssima! desse assunto, e olha que tinha dispensado um bom tempo com isso. Só lembrava que tinha alguma coisa a ver com abolir a culpa de vez, que essa coisa de paixões é da natureza humana mesmo, coisa e tal. Mas ela deve saber bem mais, ela sempre sabe bem mais e é por causa disso que sempre tentava estar por perto dela. Acha que é por isso, pelo menos. Mas agora já não sabe se acha mesmo isso. Porque toda vez que ela aparece, nunca é direto nos olhos que ele olha, é nos peitos. Sempre, sempre nos peito primeiro, depois os lábios e finalmente, depois de peitos e boca, depois de tudo isso, é que vai olhar nos olhos dela. Não que não sejam uns olhos bonitos, claro que são. Mas é que os peitos se adiantam, se antecipam. Acha fisicamente impossível que seu ser chegue antes de seus peitos onde quer que seja. Fica até constrangido, mas não tem o que fazer, cacete! porque quando vai ver, já está olhando pros peitos dela. São uns peitos imperativos, podem subjugar qualquer olhar, a qualquer hora. Sempre que está conversando com ela, tem que se policiar pra ver se não está com os olhos presos nos peitos dela. Tem que policiar sim, cacete! porque ela é uma coisa muito linda, muito inteligente, ela tem muito, muito mais que esse par mágico de signos de feminilidade, por mais que ele tente se afirmar nela. Lembra agora que a conheceu num seminário de filosofia, ela estava palestrando, ele assistindo, e ficou tão entusiasmado pelo jeito de ela expor que se apaixonou assim, num estalo, na hora. Poderia ter vivido esse sentimento à distância pelo resto da vida, saboreando lentamente o brilho daquela imagem, que sintetizou tanto conhecimento, tanta juventude e nenhuma arrogância! Por que essa gente de filosofia é sempre tão arrogante? Mas ela não é não. Estava ele, nesse encantamento todo, quase flutuando... Mas a palestra acabou, ela desceu da bancada, tirou o casaco e... Não! O sutil encantamento, que todo mundo chama de amor platônico, virou um desejo brutal, porque aquela aura feminina, etérea, quase metafísica, se materializou nos malditos peitos. E por mais inteligente que fosse, esse seu atributo físico não a deixaria nunca mais ser pensada sem eles. Mas tem certeza de que pensamentos sujos sobre os peitos dela não exclusividade sua. Tem então uma ponta de pena dela! porque deve ser muito chato isso de chamar mais atenção para o corpo do que para o que tem a dizer. Todo cara que chegar pra falar com ela sempre vai ser porque ela é muito bonita e blábláblá. Mas a pena passou, porque ela deve também gostar que todo mundo fique olhando. Deve sim! ou será que não? Pode ser que não e que só esteja pensando nisso para se sentir menos culpado por ficar olhando os peitos dela feito um tarado. Porque sentia uma culpinha sim por causa disso. Mas cacete, tem que parar com essa besteira! Não estava falando de Espinosa agora mesmo? Então! Então fica assim: ter peitos e sair mostrando e gostar de mostrar é tudo coisa da natureza da mulher e gostar de olhar pra peitos é coisa da natureza do homem. Está aí: sem culpa nem nada, tudo resolvido!
sexta-feira, 15 de dezembro de 2006
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Vem com tudo!