terça-feira, 8 de abril de 2008

Diários noturnos de Natan

I

Vem, amor, me transpassa! Me corta, me cruza, me vara de ponta a ponta! É disso que cristão gosta! E o que é mais cristão que um anjo? E o que mais anjo que eu? Eu sou o homem-anjo! Sou sim!, como não? Mas veja-se bem que uma coisa é santo e outra é anjo! E eu sou um homem-anjo. E ela foi gostar justamente de mim? É o que eu digo, as pessoas são muito loucas mesmo! Falar em loucura me lembrou que depois de toda a conversa sobre ser feliz houve ainda uma tréplica... sobre gente triste. Se existe gente triste? Ah!, é o que diz o sambinha: tristeza não tem fim, felicidade sim, né? Não sei, não sei, não sei... Li Bourdieu e agora tou com a pugatrásdorelha no que diz respeito inclinação natural. Sei lá, de repente teve gente que viveu em um meio que valoriza a tristeza porque a encara como um caráter elevado, o que, convenhamos, senhoras e senhores, é uma verdadeira merda! Valorar as coisas já é uma merda, mas valorar positivamente a tristeza é de foder!!! Se tem gente que é triste eu não sei, mas gente trouxa tem aos milhões! E o que é mais curioso: até que é democrático isso, tem gente desse tipo em todos os nichos sociais possíveis! Uma vez – isso foi demais! – uma vez eu conheci um escritor, um tiozinho de muito “bom gosto”, diga-se de passagem, que vivia cercado pela nata intelectual paulista e por belas mocinhas também (alguma até pertencente à nata intelectual também, olha que coisa!). Numa certa vez, estava ele, um filósofo, um teórico da música, uma bela mocinha só pra enfeitar, e eu só pra desenfeitar. O filósofo dizia que até que gostava de Mozart mas que não ouvia muito por achá-lo meio alegre, muito solar, essas coisas de gente feliz. O escritor foi fazendo uns comentários – ele sempre ficava só observando a conversa e abrindo parênteses aqui e ali – a respeito de essas coisas muito solares realmente não combinarem bem com coisas sóbrias e elevadas e intelectuais demais porque se você é muito alegrinho é que não entendeu nada sobre o mundo e blábláblá, até que o cara da música falou que tem sim coisas muito sombrias na obra do Mozart e tal... Nossa, eu tive até que ir embora nessa hora! Se é ruim ser alegre ou ficar alegre, o que é bom nessa porra de vida? Comer merda? E o pior é que o cara ainda publica pela 34 enquanto eu só particularizo, em vez de publicar. O errado aí, no caso, sou eu, não parece obvio?


II

O errado sempre sou eu! E assim mesmo, assim mesmo ela gosta de mim, o homem-anjo, o homem-mulher, o homem-criança, o homem-tudo-menos-homem. Não pode ser... Mas é! O que está havendo? Nada-nada-nada! É a velha coisa: ela se sente incapaz de ser amada, acha que vai ser abandonada, não confia em si. Daí, escolhe pra gostar quem é impossível pra ela: um padre, uma garota hetero, um cara casado. Agora a novidade é o homem-anjo! Então, assim: ela se apaixona por quem nunca vai corresponder e pode, assim, viver o romântico lamento de um amor impossível em lugar da dor de ser abandonada. Mas, como tudo isso é muito inconsciente, não dar pra quem ela quer a deixa muito triste e tristeza acovardada vira raiva, né? Daí ela me agride e me arruína e me perturba o sono e me liga e desliga na cara e vai embora e volta e acha que eu tou aí pra isso. E eu tou, eu tou aí pra isso sim, como não? Eu não sou um anjo??? Então... Só que eu tou fora de controle, tá tudo uma zona, nem eu acredito. Tou aberto a tudo, então, me cruza, amor, me crucifica, me arrebenta mesmo! Nada vai adiantar, nada vai mudar, me transpassa mesmo, traz a noite pra dentro de mim... E a chuva cai... E vem o homem-anjo... Uma zona!

3 comentários:

  1. hahahaha
    perfeito
    sobre a parte dois do texto quero falar com você pessoalmente, ver se entendi mesmo
    mas cara, tá mesmo cheio de gente que acha *chique* ser triste, é clichê isso - dentre os filósofos então, nossa. tem muito. acha que é bonito ser deprê, que é uma postura elevada. é cristão, isso, também - mas haja paciência.
    mais um texto lindo seu

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  2. AH, E CLARO!!! MUITO OBRIGADA DE NOVO!

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  3. A PARTE II? OLHA, É PURAMENTE LITERÁRIA, TÁ?! NÃO TEM VERDADE NENHUMA NISSO.

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