
Aves marinhas soltaram-se dos teus dedos
Quando anunciaste a despedida
E eu que habitara lugares secretos
E me embriagara com teus gestos
Recolhi as palavras vagabundas
Como a tempestade que engole os barcos
Porque ama os pescadores
Impossível separarmo-nos
Agora que gravaste o teu sabor
Sobre o súbito
O infinito parto do tempo
Por isso te toco
No grão e na erva
E na poeira da luz clara
A minha mão
Reconhece a tua face de sal
E quando o mundo suspira
Exausto
E desfila entre mercados e ruas
Eu escuto sempre a voz que é tua
E que dos teus lábios se desprende e se recolhe
Ali onde se embriagam
Os corpos dos amantes
O teu ventre aceitou a gota inicial
E um novo habitante
Enroscou-se no segredo da tua carne
Nesse lugar
Encostamos nossos lábios
À funda circulação do sangue
Porque me amavas
Eu acreditava ser todos os homens
Comandar o sentido das coisas
Afogar poentes
Despertar séculos à frente
E desenterrar o céu
Para com ele cobrir
Os teus seios de neve.
Pra tirar a zica de toda merda, um poema de um dos melhores escritores do século, o moçambicano Mia Couto. Seu forte é a prosa, em verdade. Mas o que dizer de um poema como esse?
queria escutá-lo falando seu poema no seu sotaque moçambicano.
ResponderExcluiro poema é belíssimo. Ainda mais pelas descrições do sujeito.
ResponderExcluir"Comandar o sentido das coisas"
Bom!
ResponderExcluirO que dizer de um poema como esse? É foda!
ResponderExcluirLu: um sotaque que lembra o de Portugal, mas com suas particularidades. Eu tb gostaria de escutá-lo recitando... <3
ResponderExcluirEricka: um poema muito lindo mesmo...
André e Cris: toda razão! :-)