A gente passa a vida escutando que o amor é o sentimento mais importante que existe. De minha parte, ao
menos, posso dizer que sim. É sempre o amor que deve mediar as relações: você faz muitas coisas dificílimas por amor, mata e morre por amor, perdoa as coisas mais absurdas por amor, fala o que não deve por amor... Também por amor se cria a ilusão de que é possível dividir tudo - cada cantinho da alma - com outra pessoa...
Francamente... A cada dia que passa eu tenho uma impressão mais e mais forte de que as pessoas conferem ao amor uma potência que ele não tem - quase todo mundo supervaloriza o amor.
E assim, nessa ordem de supervalorização, sempre que você toma uma atitude extremamente ferina, querendo ou sem querer, contra uma outra pessoa, pode pedir desculpa na maior cara-de-pau: “eu nunca quis te magoar... eu te amo!”. Pronto, evocou o amor e está salvo da represália que merecia... Mas não, a pessoa insiste na zanga e você apela de novo: “eu te amo muito, eu faria qualquer coisa por esse amor...”. Quem sou eu pra dizer que é mentira uma coisa assim, não é mesmo... Mas vamos e venhamos, quem faria qualquer coisa por amor, já fez e não precisaria ficar assim, se arreganhando, dizendo que faria... E outra: muito dificilmente se faz qualquer coisa só por amor...
Eu acho que quem já foi casado e não é mais pode entender disso melhor: passa a perceber que pode jogar tudo no lixo, tudo o que foi construído em nome do amor, de um amor que ainda existe e é tão forte... Mas mesmo assim, mesmo com tanto amor, o dia-a-dia está um verdadeiro saco! E de repente, meias sujas em lugares indevidos da casa passam a ser menos perdoáveis que uma traição. Triste, mas acontece...
Outra facezinha bem perversa dessa coisa de se supervalorizar o amor é que não se fala mais “te-amo”. Tem que acontecer alguma muito complexa pra surgir um “te-amo”. Explico: você está se mordendo de ciúmes? Solta um “te-amo” que a provocação pára! Está se sentindo jogado de lado: o “te-amo” resolve. Aprontou e não tem como justificar? “Te-amo” remenda tudo! Vira quase uma moeda, com valor de uso e troca. E o “eu te amo” simples, desintencionado, sem nenhuma data especial ou nenhuma conversa tensa que desague nele, esse já não existe mais... Tsc...
Eu estou começando a acreditar que tirar o amor a instituição do amor de sua bela torre de marfim é a única forma de ele recobrar a nobreza de Paulo apóstolo falava...